Durante a ditadura militar, que durou de 1964 a 1985, o Brasil sofreu, dentre outros processos de repressão, a censura dos meios de comunicação. Praticada desde o começo do regime, a censura foi potencializada com a promulgação do AI-5, que dentre outras medidas, tornava legal sua prática. Com isso foram coibidos filmes, peças teatrais, programas de televisão, músicas e textos que, de alguma forma, fossem encarados como subversivos pelo regime.

Felizmente, com o fim da ditadura, a censura foi derrubada e desde então os brasileiros gozam de total liberdade de pensamento, expressão e de imprensa. Mas será mesmo que os meios de comunicação conquistaram a tão sonhada liberdade? Este é um assunto que gera longas discussões e que, levando em conta a medida adotada nestas eleições, só nos leva a crer que a imprensa ainda tem um longo caminho a percorrer em busca de sua liberdade.

Desde o dia 1º de julho emissoras de TV e rádio estão proibidas, por lei, de divulgar todo e qualquer tipo de material que de alguma forma utilize de trucagem, montagem ou qualquer outro recurso de áudio e vídeo que sirva para denegrir ou ridicularizar a imagem dos atuais candidatos. Estas são as normas da Lei 9.504, também chamada “Lei das Eleições”. Sancionada em 1997, mas só agora atualizada, prevê uma multa que varia entre 20 mil e 100 mil reais caso desrespeitada.

A regra impede, portanto, que os programas de humor falem sobre os candidatos até o fim das eleições, caracterizando censura à liberdade de expressão e de imprensa e pondo sobre os holofotes mais vez o tema, já muito debatido. Afinal, será que, mesmo 25 anos após o fim da ditadura, ainda somos uma nação que se diz democrática, mas que no fundo ainda não o é plenamente?

O TSE defende que a medida cuida para que os candidatos recebam tratamento igualitário e que nenhum deles possa sofrer tendo sua imagem divulgada de maneira distorcida e ridicularizada. Para o comediante Helio de la Pena esse é um argumento absurdo: “A impressão que temos é que os candidatos são uns pobres indefesos, vítimas das piadas. Os políticos brasileiros estão protegidos por uma legislação absurda e exagerada” e ainda adiciona: “É como se os coitados estivessem sofrendo de bullying praticado pelos comediantes” desabafa o humorista, em seu blog.

Os candidatos devem entender que programas como CQC e Casseta & Planeta possuem uma audiência muito grande e que participar destes programas aumenta consideravelmente sua popularidade. Brincadeiras são inevitáveis e o mais importante é que são nesses programas que surgem as perguntas que todo mundo quer fazer, mas debate algum se encarrega de perguntar. Aqueles temas mais delicados e polêmicos são sempre trazidos à tona e perguntados na cara de pau. Desconforto para o candidato, que precisa se virar como pode para não sair feio na história, mas satisfação garantida para o público, que está em busca da verdadeira pessoa por trás de todo aquele jogo político.

Exemplo a ser seguido é o do Presidente Norte Americano, Barack Obama, cuja popularidade decolou uma vez que aceitou participar de programas de humor, entrevistas e até mesmo se rendeu a era digital com seu twitter. Esse rompimento com a velha maneira de fazer política mostrou que Obama era um candidato atualizado, sem medo das novas tecnologias, que não tinha o que esconder e fazia questão de mostrar isso ao público. Demonstrar esse seu lado mais humano o ajudou a vencer as eleições.

Ao invés de agir da mesma forma os políticos brasileiros estão presos ao passado e suas velhas convenções. São ultrapassados, resistentes às grandes mudanças e acreditam que o povo ainda se sente satisfeito em ouvir promessas, números, percentuais de crescimento e frases feitas. Nesse mundo globalizado, viciado em internet e em todas as informações instantâneas que ela traz, insistir nessa forma de campanha é muito mais do que batalhar por um voto, é uma batalha entre métodos e concepções antiquadas e o novo e atualizado eleitor, mais esperto e informado do que nunca.

Coibir o humor no processo pré-eleitoral não fará com que o cidadão enxergue as campanhas políticas com mais seriedade. O resultado é uma diminuição do interesse pela corrida eleitoral por parte das pessoas, pois tira as eleições das conversas entre amigos nos bares, almoços e cafezinhos. Um seleto grupo debate a política baseado em notícias divulgadas em grandes portais ou jornais de TV, mas o povão, a massa, e quem realmente elege os políticos, discute a política comentando sobre as risadas que deu assistindo ao programa humorístico da noite passada e dai então discutem as propostas e perfis dos candidatos.

"Estamos lutando contra a ignorância..."

O problema é ainda maior do que combater uma simples lei. É combater algo que se mostra como um fantasma da ditadura e que, se não nos mantermos em estado de alerta pode levar a medidas ainda piores. Em entrevista para a Rádio BBC de Londres, Marcelo Tas foi claro e objetivo: “Para mim o problema é que estamos lutando contra a ignorância, e isso não é algo tão simples de se combater”

O paradoxo é que, como a política brasileira já é considerada uma piada, proibir o humor no processo eleitoral torna as coisas um pouco confusas. Se não podem ser palhaços ou usar o humor então como os políticos farão sua campanha? Seria engraçado, se antes não fosse triste.

Humor sem Censura

Indignados com a proibição, humoristas de TV, rádio e teatro promoverão um protesto no próximo domingo (22), no Rio de Janeiro.

Liderada pelo grupo “Comédia em Pé”, a passeata “Humor sem Censura” será realizada em Copacabana, no dia 22 de Agosto às 15h. A concentração acontece em frente ao hotel Copacabana Palace. De lá os manifestantes seguirão a pé até o Leme, afim de ler o manifesto e recolher assinaturas para um abaixo-assinado a ser encaminhado ao ministro da Cultura, Juca Ferreira, para que se discuta com o TSE sobre uma alteração na nova norma.

Segundo os organizadores o evento contará com a presença de integrantes do “Rock & Gol”, “Casseta & Planeta”, “Zorra Total”, “Pânico”,”Os Legendários”, “CQC”, dentre outros.

Caso possa, compareça a passeata, engrosse a fila dos revoltados e que desejam mudanças e aproveite para exercitar sua cidadania.

Leonardo Marinho é apaixonado por games, viciado em tecnologia e apreciador de todas as formas de entretenimento. Quando possível ele tenta ser gamer, manter o Deu Tilt atualizado e levar uma vida normal. Sua consciência ainda não foi afetada pelas intempéries do tempo e ele aproveita essa façanha para redigir textos coerentes para o Deu Tilt. Ele faz o que pode…

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